terça-feira, 1 de maio de 2012

A Formação de Professores Diante dos Dilemas Pedagógicos da Sociedade do Conhecimento


    A discussão sobre a formação de professores é um tema importante no momento de se estabelecer o conjunto de posturas esperadas daqueles que assumem o desafio de educar na atualidade e no futuro. É comum que seja estabelecido, como ponto de partida, a dimensão restrita, tradicional e superficial que o conhecimento é tratado na prática pedagógica docente. Com uma formação precária, com pouca experiência teórico-prática e com dificuldades no estabelecimento de relações entre o saber técnico e a realidade do mundo do trabalho, o cenário é preocupante.
     Nas inicitaivas de formação continuada dentro das instituições de ensino, ainda são raras as reflexões que aprofundem esses aspectos, no sentido de qualificar a ação docente, especialmente na Educação Profissional e Tecnológica, onde são raros os debates contínuos de natureza pedagógica.
     Neste universo, abre-se espaço para contribuições teóricas que são acolhidas, sem que seus limites sejam considerados.
     Perrenoud* e muitos outros téricos influenciaram, a partir dos anos 90, movimentos no sentido de trazer novas referências educacionais, mais adequadas ao momento atual em que vivemos. De grande relevência, a chamada Pedagogia das Competências, propõe novos paradigmas e torna-se presente (pelo menos) nos discursos dos educadores da modernidade.
     Newton Duarte afirma que as "pedagogias do aprender a aprender" estão ligadas a um modismo pedagógico e estão relacionados aos discursos pedagógicos da Escola Nova e do Construtivismo. Assim, ele adverte que elas estão fincadas numa concepção de educação e a serviço de concepções ideológicas.
 Alguns posicionamentos valorativos, presentes nessa tendência pedagógica são destacados por ele:

  1. São mais desejáveis as aprendizagens que o indivíduo realiza por si mesmo.
  2. É mais importante o aluno desenvolver um método de aquisição, elaboração, descoberta, construção de conhecimentos, do que esse aluno aprender os conhecimentos que foram descobertos e elaborados por outras pessoas.
  3. Para que a atividade seja verdadeiramene educativa, ela deve ser impulsionada e dirigida pelo aluno.
  4. A educação deve preparar os indivíduos para acompanharem a sociedade em acelerado processo de mudança.

     A princípio, todas as considerações são consideradas importantes para transformar os paradigmas e produzir um novo fazer pedagógico. O que precisa ser discutido, entretanto, é que é possível romper limites que são postos (implícitos) em cada um dos posicionamentos.
     A aprendizagem é uma experiência de profunda natureza social. Assim, a interação entre os estudantes e com o professor é fundamental e não pode ser deixada em segundo plano. Também, as experências que o indivíduo realiza sozinho (como uma síntese) tem uma parte igulamente fundamental em todo o processo. Nesse sentido, as descobertas de outros, os processos historicamente percorridos precisam ser trazidos como parte integrante dos desafios de novas descobertas. Um não exclui o outro.
Além disso, as atividades educativas precisam ser extremamente significativas para o aluno, o que não quer dizer que cabe apenas a ele a direção de todas elas. Corre-se o risco de desconsiderar a importância do professor e da própria relação que se estabelece coletivamente em sala de aula.
    Ainda, Newton Duarte, aponta ilusões da chamada "Sociedade do Conhecimento". Vamos procurar analisar a presença desses pensamentos no pensamento e na prática docente:
    Primeira ilusão – O conhecimento nunca foi tão acessível como hoje
    Segunda ilusão – A capacidade de lidar de forma criativa com situações singulares no cotidiano é muito mais importante para a aquisição de conhecimentos teóricos.
    Terceira ilusão – O que confere validade ao conhecimento são os contratos culturais.
    Quarta ilusão – Os conhecimentos tem todos os mesmo valor, não havendo entre eles hierarquia quanto a sua qualidade.
    Quinta ilusão – O apelo a consciência dos indivíduos constitui o caminho da superação dos grandes problemas da humanidade.

   De modo geral, essas ilusões parecem distorcer ou até mesmo comprometer a centralidade do papel do conhecimento na ação pedagógica. Se o conhecimento não for o primordial na escola, como sendo a matéria-prima do professor, o que restará da principal função social da educação escolar?
   Cabe questionar ainda se, de fato, o conhecimento é assim tão acessível... Os conhecimentos teóricos perderam seu valor? A cultura tem um papel preponderante legitimidade do conhecimento? Todos os conhecimentos têm o mesmo valor, para todos? A consciência ou o saber (ou ambos) pode transformar a sociedade? É possível dizer que a Sociedade do Conhecimento pode estar estabelecendo princípios educacionais não desejáveis.
   Ao reportar-se à Sociedade do Conhecimento, Lizia Helena Nagel afirma que trata-se de uma expressão empresarial dos investimentos racionalmente programados para o mundo globalizado.
 Nesse sentido, faz toda uma argumentação explicitando que o processo de desenvolvimento da sociedade da informação se deve aos oligopólios que comandam a infraestrutura da informação e, consequentemente, tem poderes ilimitados para determinar a informação que podem ser (re) passada a sociedade. Fica evidenciado nas suas colocações que há aspectos políticos e ideológicos que definem e orientam a seleção das informações.
   Na educação, o discurso é em torno da "democratização" da informação. Entretanto, ela depende dos interesses privados dos organismos que sustentam essa mesma infraestrutura.
Nesse sentido, a educação está, de fato, a serviço dessa intencionalidade , reforçando as desigualdades sociais. Os discursos em torno da democratização, da igualdade, tendem a ofuscar e esconder as contradições sociais postas na chamada Sociedade do Conhecimento. Cabe a Escola aprofundar e desmistificar esses processos, regatando o conhecimento histórica e socialmente construído, como base do conhecimento escolar, promovendo a seleção e a reflexão sobre toda a informação imposta e comercializada. Em nome de deixar que o aluno aprenda por si mesmo, o valor do conhecimento está sendo perdido dentro das práticas docentes, que muitas vezes consideram-se revolucionárias.
   Uma nova forma de exclusão é garantida, perversamente, ao se limitar o saber dos cidadãos de países em desenvolvimento, estimulando o acesso à informação sem valorizar o acesso ao conhecimento. Nosso compromisso, enquanto educadores, é garantir o acesso, a apropriação e a elaboração do conhecimento, em todas as suas dimensões. 



Karina Mello Bonilaure
 

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* Perrenoud - Philippe Perrenoud é doutor em Sociologia e Antropologia e leciona nas áreas de currículo, práticas pedagógicas e instituições de formação nas faculdades de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Genebra.


Referências Bibliográficas

DUARTE, Newton. As pedagogias do “aprender aprender” e as ilusões da assim chamada sociedade do conhecimento. Revista Brasileira de Educação, n. 18, set-dez, 2001. p. 35-40

NAGEL, Lizia Helena. A Sociedade do Conhecimento no conhecimento dos educadores. Revista Acadêmica Multidisciplinar Urutágua, Maringá, ano I, n. 04, maio de 2002.


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